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Sim, somos negligentes. Somos negligentes pela falta de planejamento na gestão dos recursos públicos que envolvem todas as esferas governamentais e ao mesmo tempo como cidadãos, que não sabem como uma sociedade organizada pode evitar as consequências da negligência. De Norte a Sul do Brasil podemos constatar a enxurrada de desperdício do dinheiro público em obras inacabadas e mal executadas. Segundo levantamentos efetuados pela Consultoria Inter. B, a pedido da Câmara Brasileira da Indústria da Construção – Cbic, apenas na esfera federal há aproximadamente sete mil obras paradas e para concluí-las seriam necessários R$76 bilhões. Se somadas as obras sob responsabilidade dos Estados e municípios, os custos para a conclusão são estimados em R$ 144 bilhões.  As ferrovias Norte-Sul e Oeste- Leste são exemplos marcantes desse triste cenário. Em muitos casos, observa-se que a cultura da negligência e do desperdício está presente desde muito antes do inicio das obras. Editais de licitação e rituais de concorrência não respeitam as características de certos materiais. No caso da madeira, material de significativa demanda em obras do sistema ferroviário e elétrico, pode-se afirmar sem o menor receio de se estar equivocado, que as empresas responsáveis por tais obras simplesmente não sabem comprar. Primeiramente, cabe especial destaque os ares solenes, para não dizer de soberba, dos executivos de compras das empresas quando da publicação dos editais. Verdadeiros deuses, escudados por assessores, secretárias e agendas, para não mencionar a suntuosidade de suas salas, que dificultam ao máximo qualquer aproximação saudável com possíveis fornecedores ou entidades setoriais representativas.   A partir dai, o cardápio de equívocos é tão amplo que não caberiam todas as considerações neste espaço. É comum se observar uma total inversão das prioridades de exigências em processos de aquisição. Por exemplo, procedimentos relacionados ao processo produtivo da madeira tratada, assim como os devidos procedimentos necessários ao controle de qualidade não são considerados quando da análise de custos do material. Adotam-se cegamente os termos da Lei n° 8666, de junho de 1993, a qual estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras e serviços e o resto que se dane! O importante é comprar de quem oferta o mais barato. Procedimentos necessários às boas práticas de produção, incluindo o Controle da Qualidade, incidem em custos adicionais, portanto, dispensáveis na fase de aquisição por licitações. Depois de tudo isto, uma vez adquirido o material, exige-se que o mesmo atenda a todos os requisitos conceituais de um produto fabricado dentro de todos os rigores das normas, mesmo estes terem sido desconsideradas no inicio do processo de aquisição. Tudo isto se agrava quando as obras são paralisadas. Qualquer material é produzido prevendo-se a sua aplicação, claro, seguindo um planejamento no andamento das obras, conhecido também como cronograma. Afinal, os materiais são produzidos para serem utilizados e, em caso de paralizações de obras, são simplesmente armazenados, invariavelmente em condições inadequadas. Logicamente, não é justo se ter como expectativa o mesmo desempenho de um material devidamente instalado. Nos últimos anos muito se tem falado e propagado a respeito do potencial de utilização da madeira tratada em sistemas construtivos. Afinal, são muitos os bons exemplos da utilização da madeira tratada pelo setor da construção em inúmeros países desenvolvidos. No Brasil, graças aos esforços da ABPM em passado recente, com frequentes destaques, inclusive neste espaço, a respeito da existência de Normas Técnicas e Programas de Autorregulamentação do setor de proteção de madeiras, é possível afirmar, com tranquilidade, a respeito da existência de uma real retaguarda que suporta abastecimentos adequados de madeira tratada ao setor da construção. No entanto, surge um alerta! Parece que o setor privado, desprezando as experiências negativas das empresas de serviço público em relação às aquisições da madeira tratada, segue na direção dos mesmos equívocos. A busca pelos baixos preços em detrimento da qualidade parece também estar virando regra. Já se observam no mercado, grandes construtoras, que embaladas por projetos arquitetônicos maravilhosos, como só a madeira proporciona, estão realizando aquisições de grandes volumes de madeira tratada sem a menor preocupação com os termos da NBR 16.143-2013 ou com as etapas de produção, em especial quanto à qualidade das soluções preservativas, comprovações dos corretos teores de umidade antes do tratamento e verificações laboratoriais necessárias. Interessante que, diante dos processos de aquisições já concretizados, quando alertados a respeito de tais necessidades , fazem cara de ué, achando que tudo isso não passa de um mero enfeite. E assim vamos, já temos comprometidos os mercados do setor elétrico, rural e parte do ferroviário, por equívocos nos processos de aquisição e corremos o risco de vermos o setor da construção também achando que madeira tratada não é a opção mais adequada, quando na verdade , mais uma vez, esse material poderá ser vítima da desinformação.

 

 

Flavio Geraldo
FG4Mad – Consultoria em Madeira
flavio@fg4mad.com.br